A Rádio Dragão do Mar nasceu com conotação política; enquanto a
Rádio Verdes Mares já nas mãos de Paulo Cabral de Araújo apoiava
a União democrática Nacional - UDN, o Partido Social Democrático -
PSD com vistas à campanha sucessória de 1958 fazia oposição ao
Governo do Estado do Ceará, que estava nas mãos de Paulo Sarasate
(governador) e Flávio Marcilio (vice). O Rádio sempre fora um bom
cabo eleitoral e, antes do advento da Televisão era um forte
instrumento de base.
O fortalecimento da Dragão vingou na inspiração da Braveza, pois,
em dezembro de 1957 a emissora já tinha inserções experimentais e
a aparelhagem, estúdio e escritório já estavam instalados no
edifício Arara (Depois sede do Instituto de Aposentadoria e Pensões
dos Comerciários IAPC) , na Rua Pedro Pereira, centro da cidade,
ocupando todo o 11º andar do prédio.
O Jornalista Blanchard Girão teve como responsabilidade elaborar o
esquema de programação na nova emissora, que foi inaugurada aos 25
de março de 1958, data comemorativa da abolição da escravatura
negra no Ceará. A nomenclatura “Dragão do mar” foi uma justa
homenagem ao aracatiense de “Canoa Quebrada”, o jangadeiro
Francisco José do Nascimento, cognominado “Chico da Matilde”,
cuja idéia desse batismo radiofônico, segundo os contemporâneos
fora idealizado pelo radialista Olavo Peixoto de Alencar.
A música escolhida como característica foi “Terra da Luz”,
música de exaltação, de autoria de Humberto Teixeira e Lauro Maia.
Depois o humorista e compositor Silvino Neto, que em temporada por
Fortaleza, fora incumbido de produzir um seriado de vinhetas sob o
tema “Terra da Luz”, e foi quando a emissora obteve um toque mais
suave na exibição de sua programação e intervalos comerciais
A denominação de “Dragão do Mar” já tinha como sugestão uma
linha de protestos e lutas, como ficou ratificado, pois assim fora
assegurada por ondas hertzianas uma labuta que culminou com a vitória
do Sr. Parsifal Barroso, candidato da união PSD/PTB.
A rádio seria a “pedra no sapato” do Governo da UDN, onde havia
denuncias de deficiências na administração estadual, e que na
análise do hoje saudoso Jornalista Blanchard Girão: “tinha
escândalos de afilhadíssimos que caracterizavam, de um modo geral,
a prática política estadual daqueles tempos”.
Com força no setor jornalístico, que estava entregue aos irmãos
Almir e Artur Pedreira, a “Dragão” tinha obviamente um caráter
primordial: combater o Governo da UDN e a promoção eleitoral dos
candidatos do PSD. A direção política da emissora estava a cargo
do então deputado estadual Franklin Chaves. O editorial da rádio
era a crônica “A Nossa Palavra”, que ia ao ar às 12.h30,
escrita por Blanchard Girão, lida por Waldir Xavier e,
esporadicamente por Almir Pedreira.
A emissora, com forte oposição e radicalismo caiu na graça do povo
e isso contribuiu especialmente no departamento de esportes, onde
originou uma grande equipe (Ivan Lima, Gomes farias, Paulino Rocha,
Josely Moreira e muitos outros). Os programas de estúdio, muitos
elaborados por Juarez Barroso (já falecido) e Rui Paes de Castro,
todos vislumbrando dotes jornalísticos e rádio/teatro.
Programas da “Dragão”, além da crônica, ficaram líderes em
audiência, “O Contador de História”, quadros rápidos, com
resumidíssimos contos de extraordinária graça. Ressalte-se,
demais, o cast de radioteatro, dirigido por J. Oliveira, que encenou
algumas das mais ouvidas novelas de rádio da época. Neste cast
apareciam nomes jovens, que se consagrariam depois no rádio e no
teatro brasileiro, por exemplo, Aderbal Junior e Oliveira Filho.
Sem demora, a “Dragão” passou a ocupar posição de relevo no
campo radiofônico local. Em alguns horários, a “Dragão” batia
amplamente as concorrentes, razão pela qual era a emissora preferida
por alguns fortes anunciantes, como a The Sidney Ross, que
mantinha elevados contratos com a emissora para a divulgação de
seus principais produtos, como “Melhoral”, “Talco
Ross” e “Pílulas
de Vida do doutor Ross”.
A rádio, segundo alguns jornalistas, sacudiu a opinião pública,
denunciando os desmando do Governo udenista. Estes retrucavam mais
violência onde na época o Secretario de Segurança, general
Severino Sombra, mandou prender um carro de reportagens da “Dragão”.
Isto provocou uma reação histórica da imprensa local liderada por
Perboyre e Silva, presidente da Associação Cearense de Imprensa.
Uma imensa passeata de carros formou-se na Sede da ACI e se dirigiram
para o Quartel da PM em Antonio Bezerra, com até as rádios
concorrentes transmitindo os lances do acontecimento, e o povo nas
calçadas aplaudindo os jornalistas. O comando do quartel não
permitiu a entrada dos jornalistas e os mesmos se deslocaram para a
Praça dos Voluntários (Centro de Fortaleza), onde aconteceu outra
enérgica manifestação, exigindo a libertação dos companheiros
presos, o que foi afinal conseguido graças à firmeza e à valentia
pessoal de Perboyre Silva. Tudo isso fez crescer ainda mais o
prestígio e a popularidade da “Rádio Dragão do Mar”, com seus
índices de audiência subindo de tal forma que as concorrentes já
se sentiam incomodadas.
Noutra ocasião, o mesmo Secretário de Segurança, general Sombra,
mandou prender de modo arbitrário um grupo de jornalistas. Os
policiais detiveram numerosos profissionais de jornal e rádio,
dentre os quais Adísia Sá, Narcélio Lima Verde, Edmundo Maia.
Todos esses lamentáveis acontecimentos só fortaleceram a oposição,
afinal a rádio Dragão do Mar, que liderava a luta contra a orgia de
nomeações feitas pelo Governo da UDN, a esta altura, já estava
derrotado nas urnas.
Concluída a campanha com o PSD voltando ao poder, o partido sentiu
que não tinha vocação para manter uma emissora, com seu um elenco
milionário: equipe esportiva e de jornalismo, produtores de
programas, cast de rádio-teatro. Foi herdada uma folha de pagamento
altíssima, o que a colocou em permanente situação deficitária. O
PSD passou o comando da rádio, então ao Sr. Moysés Pimentel.
A “Dragão”, já politicamente prestigiada, sob a orientação de
Pimentel, tornou-se porta-voz das grandes bandeiras reivindicatórias
da época, abrindo microfones a lideranças operárias, estudantis e
mesmo camponeses. Sustentou a campanha em favor do general Lott à
presidência da República (candidato do PSD/PTB) e, assumiu posição
firme em prol da legalidade, quando da renuncia do Sr. Jânio
Quadros, sendo a única do Estado a lutar em favor da posse do
vice-presidente João Goulart.
Ao lado de Jango, a “Dragão” assumiu a linha de frente em prol
das reformas de base e foi, no Ceará o grande veiculo de divulgação
das teses progressistas que marcaram aquele período histórico
brasileiro. Em 1962, como decorrência natural da conduta da
emissora, a sua cúpula diretiva candidatou-se, sendo eleito com
grande votação, o empresário Moysés Pimentel para a câmara
federal e Blanchard Girão que era diretor de programação,
juntamente com Aécio de Borba diretor administrativo, foram para a
Assembléia Legislativa.
Os dias da “Dragão”, porém, estavam contados. Em 64, mal
estourou o “golpe”, os militares trataram de ocupar a rádio,
fechando-a e prendendo os seus jornalistas e locutores (Peixoto de
Alencar, Nazareno Albuquerque dentre outros), enquanto os deputados
Moysés Pimentel e o Blanchard Girão foram cassados e presos. Desde
62 a emissora política mantinha a sua diretriz democrática e
reformista, ao lado do Presidente da república João Goulart que
fora deposto em 1964.
A “Dragão” saiu do ar por vários meses e, quando voltou veio
sob outra direção,ou seja com o militar reformado General Almir
Macedo de Mesquita. Totalmente descaracterizada e, de tombo em tombo,
ficou na vala comum das rádios, quase ignoradas pelo público.
A Rádio Dragão do Mar, em seu primeiro período, como emissora do
Partido Social Democrático e posteriormente sob a orientação
político-ideológica do empresário Moysés Pimentel, (presidente
regional do Partido Social Trabalhista – PST) confunde-se com a
conturbada realidade sócio-política do Ceará e do País naqueles
finais de década de 50 e princípios da década seguinte.
Nacionalmente, a Dragão do Mar esteve na crista de acontecimentos
históricos da maior relevância, como a renúncia do Presidente
Jânio Quadros, seguida da afronta à Constituição vigente na
tentativa de golpe por parte dos comandantes militares, que vetaram a
posse do Vice-Presidente, João Goulart.
A Dragão foi a única emissora cearense a posicionar-se a favor da
posse do Vice-Presidente, entrando em choque, conseqüentemente, com
a área militar. Toda a momentosa jornada do governo Goulart, a luta
pelas reformas de base da sociedade brasileira, o despontar da
consciência cívica do nosso povo, estudantes e trabalhadores em
memoráveis movimentos, tudo isso perpassou através das ondas da
Rádio Dragão do Mar, cuja coerência política se manteve incólume
durante toda aquela fase. Em 1964, no auge da crise política
brasileira, a Dragão continuou impavidamente nas suas posições.
Pois bem, os estúdios da rádio Dragão do Mar, quando saiu do
edifício Arara, estiveram na Avenida do Imperador n° 690, a qual
por sua vez mudou-se para a antiga Avenida Estados Unidos (hoje
Senador Virgílio Távora) quase esquina com a Avenida Antonio Sales,
e para lembrança nossa ali era onde findava a Estância do Castelo
(Hoje Dionísio Torres) e para lá só tinha salinas. Depois o
equipamento e os profissionais trabalharam junto aos transmissores.
Os estúdios da Dragão do Mar enquanto pertencente aos Cal’s
esteve na Rua 25 de março nº. 685, e sua estação transmissora tal
como ainda está irradia da Avenida Presidente Costa e Silva
(Perimetral), no Mondubim Velho, com uma torre de 100 metros, 25 kW
de potência com o transmissor EASA, e 10 kW com o auxiliar de marca
NAUTEL.
Busquemos resumir. Com uma programação bem eclética, inclusive
reservando o horário noturno para programação evangélica, sempre
operando na freqüência de 690 kHz, com o prefixo ZYH 590, após a
concessão ao Partido Social Democrático – PSD, a emissora foi
adquirida por Moysés Pimentel juntamente com o Deputado Franklin
Chaves; posteriormente das mãos do general Mesquita a mesma fora
transferida para a Família Cesar Cal´s na pessoa de seu diretor
presidente Dr. Sérgio Cal´s.
Finalmente a famosa Dragão do Mar em 1 de agosto de 2008, fora
vendida para a Comunidade Católica Shalom. Seus estúdios
hoje estão localizados na Rua Maria Tomásia, no Bairro Meireles.
A programação jornalística, musical, e toda diversificação fora
erradicadas. O povo continua ouvindo rádio, mas a bravura política
e a diversificação aprendida pela didática dos microfones da 690,
foi para a história.
É dizer como o saudoso radialista Wilson Machado: “E os anos
carregaram”.